Este artigo do companheiro Nonato Reis, merece ser lido, relido,  compartilhado, analisado, enfim, publicado. Mesmo sem sua autorização, tomei a liberdade de publicar neste espaço.

 

O fanatismo é a pior praga da humanidade, mais devastadora do que as provocadas por micro-organismos. Enquanto as pandemias viróticas atacam a vida em escala planetária, o fanatismo atinge o espírito. Elimina do homem aquilo que o diferencia das demais espécies de seres vivos na Terra: a capacidade de pensar, de refletir sobre a sua condição no mundo e de tomar decisões.

Um fanático é um louco, alguém capaz de seguir por um caminho de olhos fechados, ainda que este caminho o leve ao abismo.

Estima-se que tenha se originado na Suméria – como quase tudo na vida – a primeira civilização de que se tem notícia, e infectou o cérebro a partir do momento em que o homem caminhou em direção ao sobrenatural. Como não tinha respostas para uma série de questões de fundo metafísico, e por intuir que, acima dele havia uma entidade superior a determinar os seus passos, deixou de lado a razão e passou a cultuar o delírio.

No braço latino, deriva de fanacticus, que significa “pertencente ao templo”, inspirado pelos deuses. Do lado grego, tinha o significado de entusiasmado, ou seja, impregnado da presença divina. Os antigos associavam o fanatismo, ou entusiasmo, ao fenômeno transcendental que captura a mente. Quer dizer, o fanático era aquele sujeito que emprestava o cérebro para a divindade.

O resultado dessa associação irracional de criador e criatura só poderia resultar em algo tenebroso. No século 3 da era cristã, um filósofo persa chamado Mane, acreditando-se descendente de uma geração de profetas, desde Adão, passando por Buda, Zoroastro e o próprio Cristo, organizou uma doutrina de fundo religioso amplamente difundida na Europa que separava os bons e os maus, conforme a sua visão de mundo. Bons eram os elevados espiritualmente; maus, os dominados pela matéria.

E o que havia de errado nisso? Nada. Na essência muito parecida com a doutrina espírita de Kardec, o maniqueísmo exibia um alicerce filosófico inteligente, porque valorizava aquilo que o homem tem de melhor, a capacidade de refletir sobre a sua relação com o metafísico e buscar, racionalmente, o estágio da sublimação.

Ocorre que, no decorrer do tempo, a doutrina de Mane passou por um processo de corrupção e chegou aos dias atuais inteiramente deformada por seitas e correntes políticas de todos os matizes.

No domínio da Santa Inquisição, bons, para a Igreja, eram aqueles que professavam o catolicismo com toda a sua gama de virtudes e deformações; maus, os que não eram católicos, a quem chamavam de hereges. Milhões de vidas inocentes, cujo pecado mortal foi contrariar os dogmas católicos, tiveram suas vidas assadas no fogo da insanidade.

 

Adolf Hitler, responsável por conduzir a Alemanha ao Holocausto e condenar milhões de vidas em campos de concentração, separava bons e maus conforme a insígnia. Se fieis seguidores da suástica, seus amigos; se portadores da estrela de Davi, inimigos mortais.

O nazismo, mesmo varrido do Planeta, no final da segunda guerra mundial, virou uma espécie de alma penada, que produz adeptos até hoje pelo mundo afora.

Para Hitler, um dos cardeais desse dualismo tresloucado que separa bons e maus pela própria régua, o destino da humanidade seria ditado pela insensatez . “O futuro do movimento é condicionado pelo fanatismo, sim, a intolerância, cuja aderência o sustenta como o único movimento correto, e o impulsiona sobre outras formações similares.”

Nistzsche o compreendia como uma doença oportunista que mira o organismo fragilizado. “O fanatismo é a única forma de vontade que pode ser incutida nos fracos e nos tímidos.”

Trazendo a questão para os dias de hoje, é de se perguntar: quem afinal pode-se enquadrar como seguidor dessa filosofia lunática?

Entrego a resposta a Winston Churchill, o estadista britânico a quem muitos consideram como responsável pela derrocada do nazismo. Para ele o fanático “é aquele que não quer mudar de ideia nem de assunto”.

Melhor definição impossível. O fanático fecha com o líder e por ele morre, se possível, ainda que aquele a quem proclama como farol perpetre as maiores atrocidades. Tem cérebro, mas não o utiliza, reduzido a simples peça decorativa no ambiente da cabeça. Deixa-se programar para agir como robô. Pega as ideias que lhe são ditadas e as passa adiante, como imperativo de verdade.

Como não pensa, tudo o que soa racional, ou que exija um mínimo de reflexão, descarta como se fora matéria podre. Igual Hitler, que lia a primeira e a última páginas dos livros e decidia se deviam ir para a biblioteca ou para o cesto de lixo. Por ter abdicado de pensar, o fanático não consegue interpretar uma simples mensagem, por mais clara que seja. E por ser assim, descarta ler ou assistir o noticiário das grandes redes, por considerá-lo mentiroso, mas aceita receber e propagar notícias que circulam em grupos de whatsaap, a maioria sabidamente falsa, porque de fontes apócrifas ou sem registro formal.

  1. Outro dia eu compartilhei um chamamento para uma carreata em favor da abertura do comércio em São Luís e disse que aquilo configurava crime contra a saúde pública. Uma leitora comentou que a minha mensagem não tinha pé nem cabeça, afinal “que risco de contaminação uma carreata pode oferecer?” Deu vontade de dar uma resposta à altura, mas, contido, suspirei e respondi candidamente: “Leia novamente e veja se eu disse ou insinuei isso”. Ou seja: o fanático é aquele que já morreu e nem se deu conta.