Por Abdon C. Marinho. Advogado, Escritor
DURANTE minha última incursão pela Baixada com Max Harley, José André e Alison
Fernando – quando fomos até Carutapera –, enquanto fazíamos o longo percurso apreciando
uma inusitada paisagem de campos desérticos em pleno dezembro, comentava sobre uma das
imagens mais inspiradoras que tomei conhecimento nos últimos tempos.
Falava do transporte de uma carcaça de avião que saindo da capital do estado iria se
transformar em uma biblioteca no interior do estado, mais precisamente no Município de Vargem
Grande.
Max que presta serviço de contabilidade naquele município me atalhou: — ah, doutor, faz
muito tempo que seu Carlinhos Barros fala sobre isso, que iria transformar a educação de Vargem
Grande e que iria fazer “pousar” um avião por lá.
Tanto eu quanto ele trabalhamos na eleição quando Carlinhos Barros elegeu-se pela
primeira vez e, acho que, também, na segunda, mas apenas na parte eleitoral, Max que trabalhou
na campanha seguiu na gestão ajudando-os com seus serviços e vastos conhecimentos. Na
última eleição (2024) mais uma vez trabalhamos juntos no eleitoral.
Refleti sobre a questão do avião-biblioteca. Achei extremamente curioso tal sensibilidade
tenha partido não de um educador, mas de um empresário que se encontra gestor de município.
Acompanhando a “odisseia” do avião rumo ao seu destino vi o brilho e olhar de curiosidade
de crianças e até mesmo de adultos com tal engenho. Isso que é esplêndido em se tratando de
educação.
O brilho no olhar de uma criança é o verdadeiro despertar de sonhos. Esse é o papel do
educador: fazer com que as crianças e jovens possam despertar os sonhos que cada um traz
consigo e que muitas das vezes, pelas dificuldades que carregam por toda vida, sequer são
despertados. Morrem com elas sem jamais virarem realidades.
O Município de Vargem Grande, nos últimos anos, operou uma verdadeira revolução na
educação com indicadores jamais vistos anteriormente se tornando uma referência nessa área.
Mas, a despeito disso – que devemos considerar muito –, outros gestores, também, melhoraram
seus indicadores, talvez, não tanto quanto Vargem Grande, mas, melhoraram.
A ideia do avião-biblioteca vai além disso, vai além do indicadores porque significa
despertar sonhos e isso não pode ser quantificado em números.
E, por isso mesmo, é curioso que tal compreensão e sensibilidade tenha partido de um
empresário que até então não tinha conhecimento desse seu “olhar” pela educação.
Digo isso com conhecimento de causa.
Há alguns anos tenho tentado conciliar minha atividade jurídica com a de empresário do
setor educacional tendo, inclusive, uma participação em empresa que desenvolve projetos
educativos.
Essa empresa, a AME Mais Educação é uma EDUTEC que tem por meta alfabetização
das crianças do Brasil até o oitavo ano de vida em pelo menos duas línguas: português e inglês
através do projeto Cidade Bilíngue.
A empresa possui outros projetos na área de línguas para o ensino médio, público geral,
cursos direcionados ao seguimento turístico, jurídico, médico, etc.
A minha origem camponesa e pobre sempre me despertou o interesse pela a educação
como uma forma eficaz de desenvolver as potencialidades de crianças e adolescentes e com isso
fazer o país crescer. Esse foi um dos motivos que me fez apostar em uma empresa que tem esse
propósito.
Esse adendo é feito apenas para pontuar que a educação brasileira ainda é muito
desigual, apenas para citar um exemplo dentro assunto anterior, enquanto as crianças da rede
privada começam a estudar língua inglesa no ensino infantil, na rede pública esse ensino só é
obrigatório a partir do sexto ano, são, pelo menos oito anos “roubados” dessas crianças, que
quando são “obrigados” a estudarem uma segunda língua encontram um material incompatível
com a sua realidade e acabam desistindo, não se interessando, ou aprendendo apenas o
suficiente para “passar” de ano.
Para o estudioso do assunto, ex-ministro, ex-governador, ex-senador, Cristovam Buarque,
trata-se de um equívoco, vez que deveríamos já alfabetizar as crianças em dois idiomas – pelo
menos.
Pois bem, nessa missão que me impus de levar uma educação de qualidade e igualitária
para todas as crianças, desde os quatro anos ao ensino médio, profissional e até para os idosos,
tenho me deparado com inúmeras situações curiosas.
Muitos “educadores” ainda se encontram presos aos conceitos que chamo de educação de
“casa grande e senzala”.
Quem conhece um pouquinho de história sabe do que falo. Enquanto os ricos, bem
nascidos, os senhorzinhos e sinhazinhas estudam nas melhores escolas as crianças pobres
recebem uma educação de péssima qualidade ou não recebem educação nenhuma.
Isso resta claro nas vezes em que ouvi de secretários de educação ou mesmo de alguns
coordenadores pedagógicos as seguintes frases: – doutor, como essas crianças vão aprender
inglês se não sabem português? Ou, esse material é uma “Ferrari” não vai servir para nossas
estradas. Ou, os nossos professores não vão aceitar mais esse encargo.
Esses são apenas alguns exemplos dos diversos tipos que já encontrei. As vezes os
gestores se interessam em melhorar a educação do município e encontram resistências daqueles
que por serem “educadores” não deveriam resistir, ao contrário deveriam ser os primeiros a
cobrarem melhorias para a educação.
Em muitas situações, infelizmente, aqueles que deveriam explorar as potencialidades das
crianças e jovens são os primeiros a “duvidarem” de suas potencialidades.
Muitos fazem isso, pasmem, por ignorarem que qualquer criança, adolescente, jovem ou
pessoa de qualquer idade é capaz de aprender.
Muitos fazem isso por comodidade: “estou recebendo o ‘meu’ todo mês por que vou querer
mais trabalho?”.
Costumo dizer que comportamentos refratários a ofertar o maior número de ferramentas
possíveis de aprendizagem as crianças e adolescentes são “roubos” as suas oportunidades.
Ao negarem que crianças, adolescentes e jovens tenham uma educação de qualidade
estão lhes roubando o futuro.
Vejam como é irônico: quem custeia a educação do país são as crianças, adolescentes,
adultos e idosos matriculados na rede, quando os gestores de tais recursos negligenciam suas
necessidades estão lhes “roubando”. E, o pior, roubando-lhes o que se tem mais importante: o
futuro.
Quanto vi a história do “avião do CB” (CB de Carlinhos Barros) fiquei pensando: pô, cara,
esse cidadão que é empresário a vida toda, a ponto de nem sabermos sua profissão de formação
é capaz de compreender a necessidade de despertar o sonho de milhares de crianças, de
devolver-lhes o brilho do olhar, que coisa maravilhosa.
Que lição ele ministra a tantos “educadores” incrédulos.
Isso mostra que nem tudo está perdido.
Na estrada comentava com Max: — isso merece um textão.
Viva a educação!
Abdon C. Marinho é advogado.
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